sexta-feira, 9 de junho de 2017

O Manifesto Comunista - Marx e Engels

NOTA: O texto a seguir não é de minha autoria. Fonte e autor seguem abaixo. Grifos e edições minhas.
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Resenha: Manifesto Comunista - Por Juliano Wentz

       Desde os primeiros tempos da História a sociedade existiu através da luta de classes sociais, ou seja, entre burgueses e proletários, verificamos assim, quase por toda parte, uma completa divisão da sociedade em classes distintas, uma escala graduada de condições sociais que reina até os dias de hoje. Desde a época do feudalismo, a sociedade divide-se em dois campos antagônicos: a burguesia e o proletariado. Os burgueses se fortificaram com o desenvolvimento do comércio, que desde então vem a fortificar seu poder, tanto financeiro quanto político. A industrialização também vem a privilegiar o burguês, pois a burguesia só pode existir com a condição de revolucionar incessantemente os instrumentos de produção, por conseguinte, as relações de produção e, com isso, todas as relações sociais. Com o estabelecimento da indústria moderna e do mercado mundial, a burguesia conquistou autoridade política exclusiva no Estado representativo moderno. Um dos principais fatores que levam a burguesia a um acúmulo de capital são os baixos preços de seus produtos.
       A sociedade rural da vida feudal perdeu sua importância, a burguesia subjugou o país às leis das cidades. A população urbana aumentou grandemente. Do mesmo modo, os países bárbaros tornaram-se dependentes dos países civilizados. Com o desenvolvimento da burguesia (capital), desenvolve-se também o proletariado, a classe dos operários modernos, que só podem viver se encontrarem trabalho e que só o encontram na medida em que este aumenta o capital. Esses operários, constrangidos a vender-se diariamente, são mercadoria, artigo de comércio como qualquer outro.
      O crescente emprego de máquinas e a divisão do trabalho, despojando o trabalho do operário de seu caráter autônomo, tiraram-lhe todo atrativo. O produtor passa a um simples apêndice da máquina e só se requer dele a operação mais simples. A organização do proletariado em classe e, portanto, em partido político, é incessantemente destruída pela concorrência que fazem entre si os próprios operários. O custo de produção de um trabalhador é restrito, quase completamente, aos meios de subsistência que ele requer para a sua manutenção e para a propagação de sua raça.
   De todas as classes que ora enfrentam a burguesia, só o proletariado é uma classe verdadeiramente revolucionária. As outras classes degeneram e perecem com o desenvolvimento da grande indústria; o proletariado, pelo contrário, é seu produto mais autêntico. O movimento proletário é o movimento espontâneo da imensa maioria em proveito da imensa maioria. O proletário, a camada inferior da sociedade atual, não pode erguer-se, pôr-se de pé, sem fazer saltar todos os estratos superpostos que constituem a sociedade oficial.
    A condição essencial da existência e da supremacia da classe burguesa é a acumulação da riqueza nas mãos dos particulares, a formação e o crescimento do capital; a condição de existência do capital é o trabalho assalariado. Este baseia-se exclusivamente na concorrência dos operários entre si.

“A burguesia produz, sobretudo, seus próprios coveiros. Sua queda e a vitória do proletariado são igualmente inevitáveis”.


Proletariados e Comunistas

     Os comunistas apoiam os proletários como um todo, pois objetivo imediato dos comunistas é o mesmo que o de todos os demais partidos proletários: constituição dos proletários em classe, derrubada da supremacia burguesa, conquista do poder político pelo proletariado. A característica distinta do comunismo não é a abolição da propriedade em geral, mas a abolição da propriedade burguesa. Censuram os comunistas por querer abolir a propriedade pessoalmente adquirida, fruto do trabalho do indivíduo, mas o trabalho assalariado não cria propriedade para o proletário, cria o capital, isto é, a propriedade que explora o trabalho assalariado.
     O capital é um produto coletivo: só pode ser posto em movimento pelos esforços combinados de muitos membros da sociedade. O capital não é uma força pessoal; é uma força social. Assim, quando o capital é transformado em propriedade comum, pertencente a todos os membros da sociedade, não é uma propriedade pessoal que se transforma em propriedade social.
“O que queremos é suprimir o caráter miserável desta apropriação que faz com que o operário só viva para aumentar o capital e só viva na medida em que o exigem os interesses da classe dominante.”
    A teoria dos comunistas pode ser resumida na sentença: abolição da propriedade privada, o fim da exploração dos muitos pelos poucos. Na sociedade burguesa existente, a propriedade privada já acabou para nove-décimos da população. A sua existência para os poucos deve-se simplesmente à sua não existência nas mãos desses nove-décimos.
   O comunismo não retira a ninguém o poder de apropriar-se de sua parte dos produtos sociais, apenas suprime o poder de escravizar o trabalho de outros por meio dessa apropriação. Na proporção em que a exploração de um indivíduo por outro termina, a exploração de uma nação por outra também terminará. Na proporção em que o antagonismo entre classes dentro de nações desaparece, a hospitalidade de uma nação para outra terminará. A supremacia do proletariado fará com que os antagonismos sociais desapareçam ainda mais depressa. A ação comum do proletariado, pelo menos nos países civilizados, é uma das primeiras condições para sua emancipação. O proletariado utilizará sua supremacia política para arrancar pouco a pouco todo capital da burguesia. A história de toda a sociedade antiga constitui no desenvolvimento de antagonismos de classe, antagonismos que assumiram formas diferentes em épocas diferentes.
   Em suma, o comunismo é a ruptura mais radical com as relações de propriedade tradicionais existentes no capitalismo, em que o desenvolvimento livre de cada um é a condição para o desenvolvimento livre de todos.
     
    Esta obra reflete a visão critica de Marx e Engels sobre o capitalismo, a luta e a necessidade da união dos proletários contra a burguesia. Publicada em 1847. Constituindo-se num importante documento que delineava em seus pontos essenciais as bases econômicas e a luta de classe como o motor da história. Segundo seus autores, para surgir uma sociedade sem classe e sem exploração, esta só seria possível através da união dos proletários. Este documento histórico é um ponto de convergência de várias tendências políticas e ideológicas, baseado em muitas lutas proletárias e que viria influenciar gerações posteriores do movimento operário e as posteriores lutas de libertação do homem pelos seus direitos. [Os autores], em sua obra, fornecem instrumentos necessários para a compreensão da exploração do homem em suas diferentes dimensões, mostrando as contradições de realidade.
Este documento destaca as duas  grandes classes oposta: a burguesia e a proletária. Burguesia, classe surgida com a decadência dos feudos, seus “superiores naturais”, e ao se livrarem dos seus poderes, substituem essa liberdade conquistada com tanto reforço  e em lugar de exploração velada por ilusões religiosa e politicas, a burguesia colocou uma exploração aberta, cínica direta e brutal, rasgando o véu do sentimentalismo que envolvia as relações da família e reduziu-as em simples relação monetária.

[...]

   Na compreensão de Marx e Engels, os comunistas deveriam procurar constituir-se em grupos organizados no interior dos partidos operários de massa que possuíssem nítidas características democráticas, a fim de dar-lhe direção mais firme na luta socialista.
    Concluem afirmando que os comunistas dariam seu total apoio a qualquer atividade revolucionária que se movimentasse contra o estado de coisas existente em qualquer tempo e lugar, salienta ainda que os comunistas deveriam estar empenhados na união e no entendimento com partidos democráticos de todo mundo.

Nota-se que os autores não estavam preocupados em apresentar uma fórmula universal, pronta e acabada de partido, e sim, princípios que deveriam ser adaptados às organizações proletárias tendo como objetivo final a transformação da classe trabalhadora na verdadeira liderança intelectual e política de cada país. Diante disso, pode-se finalizar dizendo que essa obra em questão constitui um magnífico instrumento para a humanidade, pois nos pensamentos transcritos nesse documento representa um agudo grito contra o processo mecânico e a alineação do homem, contra sua perda da cidadania, de humanidade  e sua transformação em objeto explorado.

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Fonte na íntegra e sem edições minhas disponível em (https://pedagogiaaopedaletra.com/resenha-manifesto-comunista). Acesso em 09/06/2017.

Max Weber - Os Tipos de Dominação

NOTA: O texto a seguir não é de minha autoria e a fonte segue ao fim deste. Edições e grifos meus.
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Os Três Tipos de Dominação - Max Weber

       Há uma relação de dominação quando uma quantidade qualquer de indivíduos obedece a uma ordem vinda de parte da sociedade, seja ela composta por uma ou por diversas pessoas. A dominação é sempre resultado de uma relação social de poder desigual, onde se percebe claramente a existência de um lado que comanda (domina) e outro que obedece. Podemos assemelhar assim a dominação a qualquer situação em que encontremos indivíduos subordinados ao poder de outros. Mas a dominação difere das relações de poder em geral por apresentar uma tendência a se estabilizar, a procurar manter-se sem provocar confrontos. Em outras palavras, as relações de dominação dentro de uma sociedade se caracterizam por buscar formas de legitimação, de serem reconhecidas como necessárias para a manutenção da ordem social.
        O sociólogo alemão Max Weber apresentou, em um de seus estudos mais importantes, três tipos puros de dominação legítima, cada um deles gerando diferentes categorias de autoridade. São classificados como puros porque só podem ser encontrados isolados no nível da teoria, combinando-se quando observados em exemplos concretos.
  • O primeiro deles é a dominação tradicional.Significa aquela situação em que a obediência se dá por motivos de hábito, porque tal comportamento já faz parte dos costumes. É a relação de dominação enraizada na cultura da sociedade. Um exemplo extremamente claro é o da família patriarcal: os filhos obedecem aos pais devido a uma relação de fidelidade há muito estabelecida e respeitada.
  • O segundo tipo é a dominação carismática.Nela a relação se sustenta pela crença dos subordinados nas qualidades superiores do líder. Essas qualidades podem ser tanto dons sobrenaturais quanto a coragem e a inteligência inigualável. Podemos tomar como exemplo qualquer grupo religioso centrado na figura do profeta, que apenas através de suas habilidades e conhecimentos pessoais, sem o uso da força, consegue arregimentar um grande número de seguidores.
  • O último tipo de dominação é a dominação legal, ou seja, através das leis.
    Nessa situação, um grupo de indivíduos submete-se a um conjunto de regras formalmente definidas e aceitas por todos os integrantes. São essas regras que determina ao mesmo tempo a quem e em que medida as pessoas devem obedecer. Um exemplo ilustrativo é o do empregado que acata as ordens de um superior, seja ele o patrão ou não, de acordo com as cláusulas (regras, leis) do contrato assinado por todas as partes.
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       Outra questão apontada por Max Weber é que, conforme a relação de dominação tem seu alcance ampliado, torna-se necessária a adoção de mecanismos que possibilitem a sua expressão uniforme e que garantam a execução de suas ordens, mecanismos estes que geralmente se apresentam sob a forma de equipes de apoio. Cada um dos tipos apresenta uma maneira especial de selecionar pessoas para essas equipes. Num contexto tradicional seus integrantes são determinados conforme sua experiência, sua fidelidade e sua intimidade com a tradição são reconhecidas pelo grupo e pelos seus superiores. Em um ambiente carismático a equipe é pessoalmente escolhida pelo líder, de acordo com as afinidades entre eles. Mas não podemos deixar de assinalar a importância de que os escolhidos também apresentem qualidades que garantam sua proeminência sobre a população. Por fim, num meio mantido por regras comuns, a determinação dos membros da equipe deve seguir, da mesma maneira, normas universais. Neste caso essas normas geralmente se resumem à competência e à eficiência para executar as atividades necessárias, e a burocracia aparece como sua forma mais completa.

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Fonte na íntegra e sem edições minhas disponível em (http://www.cienciashumanas.com.br/resumo_artigo_5028/artigo_sobre_os_tres_tipos_de_dominacao_segundo_max_weber). Acesso em 09/06/2017.


Karl Polanyi - A Grande Transformação

NOTA: O artigo a seguir é um resumo em inglês dos capítulos 1 ao 10 de "A Grande Transformação", Karl Polanyi. O autor é citado abaixo. O texto contém edições e grifos meus.

Comentário: Este texto foi excelente para mim quando precisei fazer uma resenha de alguns capítulos deste livro. Polanyi é muito detalhista e explica os fatos em longa narrativa. Como escritora e leitora gosto de textos informativos e expressivos, mas de igual modo objetivos. É uma boa dica, além de apenas ler um texto longo, com o sério risco de se 'perder' no meio de tantas ideias, ler resenhas e fichamentos feitos por outra pessoa, pois assim o leitor atual 'dialoga' com outros leitores prévios mentalmente, e tem a oportunidade de ter mais de uma visão do que foi lido.
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The Great Transformation  - Chapters 1-10 (Por Adam Melkus)

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Extremely rough summary of points from each chapter. No comment offered.

1. The structural foundation of European peace until World War I was a large, interlocking and complex “haute finance” system built on credit. This system could not operate with a risk of general war at hand, and the health of interlinked European economies helped contain military competition. However, colonial expansion and protectionism were harbingers of a larger conflict ahead.

2. The end of the international gold standard (IGS) at the close of WWI marked end of prewar system. Efforts to restore the IGS after WWI, symbolically linked with the prewar political order, failed. Currency crises that exposed wealthier countries to the maladies of poorer European states signaled the beginning of a new reality inherent in a completely monetarized international economy. Polanyi argues that failure to rescue IGS and birth of true market economy put nail in coffin of old order.

3-4. Polayni begins with vignette about impact of agricultural advances in 1490s Britain–shift in technological and economic means leads to disruptive social changes and state desire to slow rate of change and impact. Survey of anthropological research arguing that premodern societies did not have market economies that we might recognize, and instead practiced redistribution and householding.

5. Origin of trade in “external sphere” unrelated to “internal economy.” Long-range trade for barter purposes did not necessarily create markets. Internal economy created by origin of state in Western Europe, with controlled system of local markets. Inherent conflict between protectionist town markets and mobile capital in the form of long-range trade. Mercantilism, a reaction to need for centralized states for greater resources, broke down urban power and created national markets.

6. Conflict between mercantilist national policy and the idea of national market. Frozen land and labor relations embedded in feudal order and guilds conflicted with need for market economy that could trade both as commodities. Conflict, in essence, between idea of self-organizing market that stood outside society and the societal relations that underpinned English politics.

7. Speenhamland reforms as response to challenge posed by emergence of national markets. Physical restriction of labor to poorhouses, minimum income allocated to poor and paupers regardless of productivity/willingness to work. No incentive for employers to pay wages. New classes of employers created by national market, but no employees because labor still tightly controlled. Speenhamland, intended to slow down social change, backfired and pauperized English poor.

8. Statute of Artificers and Poor Laws laid down organization of labor. Enforcement of labor, seven years’ apprenticeship, and yearly wage assessment by public officials. Local control delegated to parishes, which maintained poorhouses. Growth of external trade and industrial tech made Speenhamland policies untenable. Paupers multiplied, and became national social crisis. Fluctuations in external trade generated unemployment and end of labor mobility restrictions led to paupers being free to roam. Repeal of Speenhamland reforms and Poor Laws signal of dawn of industrial revolution.

9. Pauperism and utopian visions went hand in hand. Quakers, liberals, and other political thinkers despaired about the problem of the pauper and set up charities, communes, and industry houses that would aim to give paupers an opportunity to work. Many of these schemes did not work out fairly well, but some would later inspire 19th century Communist ideas of utopia.

10. Comparison of Townsend, Malthus, Bentham, Burke, and other thinkers. Townsend uses allegory of an island in which population is controlled by hunger (e.g. balance of nature). In the eyes of Townsend and Malthus, political economy was a function of nature, whereas other political thinkers had merely analogized humans to animals. Biological vision (which seems to have prestaged social Darwinism) motivates idea of a natural order free of government control. Burke was worried about growing population of paupers and thought freeing of labor would remove burden on parishes. Bentham disliked idea of enforced labor as punishment and thought ‘natural’ incentives enough. Combination of liberal and conservative demand for end of Speenham system developed true market system in England.
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Fonte integral e sem edições minhas disponível em (http://adamelkus.tumblr.com/post/43476465164/the-great-transformation-chapters-1-10). Acesso em 09/06/2017.

Georg Simmel - Questões Fundamentais da Sociologia

Resumo do livro: "Questões Fundamentais da Sociologia" de Georg Simmel, por Clark Mangabeira (mestrando em Ciências Sociais pelo PPCIS da UERJ) - cortes e grifos meus.  



       O lugar que Simmel ocupa entre os autores clássicos da sociologia é um ponto de controvérsia, especialmente nos círculos acadêmicos mais tradicionais do Brasil, nos quais Weber, Marx e Durkheim ainda são considerados os principais autores da teoria social clássica. No entanto, Simmel foi um dos responsáveis pela consolidação da sociologia na Alemanha, mesmo não tendo encontrado lugar efetivo nas universidades por causa dos problemas com o anti-semitismo, a rígida estrutura acadêmica e a institucionalização das ciências sociais diante da qual seu ensaísmo não encontrava espaço permanente. Atualmente, o crescente interesse por sua obra demonstra nova tendência das ciências sociais de buscar inspiração na sua micro-sociologia.
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     No primeiro capítulo (O âmbito da sociologia), Simmel apresenta sua concepção da sociologia, definindo seu objeto e respondendo às críticas que negam seu caráter científico. Para o autor, o objeto desta ciência não é a vida dos indivíduos, mas sim a realidade formada a partir delas, observada por meio de síntese intelectual. Mesmo sendo um constructo, a sociedade possui diversos agrupamentos e configurações dignas de serem pesquisadas e que não se confundem com a vida de cada indivíduo envolvido, ressaltando Simmel que o próprio conceito de indivíduo é igualmente uma construção abstrata, de modo que qualquer análise neste nível também se vale, necessariamente, de uma abstração de qualidades, forças e histórias, sintetizadas naquele conceito.

     A perspectiva sociológica se qualifica visto ser incorreto pensarmos que só podemos conhecer a realidade por meio dos indivíduos. Ambos os conhecimentos construídos, seja a partir do indivíduo, seja a partir da sociedade, podem ser traduzidos como uma formalização intelectual do real imediatamente dado (p. 15). A decisão do nível no qual a realidade deve ser investigada, se a partir do sujeito individual ou coletivo, é delimitada pelo propósito do conhecimento, sendo os dois pontos de vista, modos de observação igualmente distantes da realidade.

     A categoria sociedade, para Simmel, deve ser entendida, mais amplamente, como a interação psíquica entre os indivíduos (p.15). A definição social não abrange apenas as interações duradouras já cristalizadas, como Estado, família e igreja, organizações supra-individuais. A sociedade significa que, por um lado, os indivíduos estão constantemente ligados uns aos outros, influenciando e recebendo influências; e, por outro, algo funcional, que os indivíduos fazem e sofrem ao mesmo tempo: a sociação.
A sociedade constitui, portanto, não uma substância, algo concreto em si mesmo, mas um acontecer, “que tem uma função pela qual cada um recebe de outrem ou comunica a outrem um destino e uma força” (p. 18).
       O autor continua sustentando o caráter científico da sociologia ao afirmar que, tal qual todas as demais ciências humanas, ela define seu objeto por processos de abstração, dissipando as existências individuais em um conceito próprio. Como os seres-humanos vivem em constante interação uns com os outros, tal fato traz um novo modo de observação para as ciências do espírito: o ponto de vista da produção social, pelo qual entende-se que todas as formações – linguagem, religião, família, etc – se produzem na relação entre os indivíduos.
Assim, “a sociologia não é somente uma ciência com objeto próprio, delimitado e reservado para si, o que a oporia a todas as outras ciências, mas ela também se tornou sobretudo um método das ciências históricas e do espírito” (p.22), de maneira que as demais ciências se aproveitam do método sociológico sem, necessariamente, perderem seu foco, mantendo suas autonomias.
       Partindo dessas considerações, Simmel apresenta três grandes conjuntos de problemas sociológicos:
  • O primeiro deles, o estudo sociológico da vida histórica – sociologia geral –, é a tentativa de explicação dos diversos fenômenos da vida humana pelo viés do método sociológico, levando-se em consideração que a vida social é apenas uma dentre várias categorias de interpretação possíveis, parcial como qualquer outra.
  • O segundo grupo é o estudo das formas societárias – sociologia pura ou formal –, aqui sim se delimitando o objeto da nova ciência, pois “se a sociedade é concebida como a interação entre os indivíduos, a descrição das formas de interação é tarefa de uma ciência específica, em seu sentido mais estrito, assim como a abstração geométrica investiga a simples forma espacial de corpos que existem somente empiricamente como formas de conteúdos materiais” (p.33). Desta forma, a sociologia pura tem por objeto os fenômenos no momento de sua sociação, livres dos seus conteúdos que ainda não são sociais para si.
  • Por último, o terceiro grupo de questões, que leva em consideração a sociedade como um fato, é o estudo dos seus aspectos epistemológicos e metafísicos – a sociologia filosófica. As ciências sociais estariam delimitadas por dois âmbitos filosóficos: de um lado, as indagações acerca das bases para a realização da pesquisa (pressupostos e conceitos fundamentais) e, de outro, as conclusões, conexões e problemas que não encontram lugar na experiência concreta. Neste sentido, saber se a sociedade é o objetivo ou meio da existência humana, por exemplo, é uma pergunta que não se responde pela averiguação dos fatos, mas tão somente pela interpretação das particularidades em busca de uma visão global da realidade social, surgindo a sociologia como teoria do conhecimento.
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     A partir do capítulo 2, Simmel coloca exemplos analíticos de questões pertencentes a cada um dos grupos explicados, sendo o segundo capítulo (O nível social e o nível individual) um exemplo da sociologia geral. O autor parte das diferenças entre a vida individual e a vida social, ressaltando que a unidade do grupo precisa ser tratada como se fosse um sujeito, com leis e características próprias, sendo fundamental para o questionamento sociológico as diferenças entre as duas experiências. No centro desta diferença está a característica dos grupos de terem propósitos e objetivos mais definidos que os individuais.
A massa não conhece o dualismo e as indecisões visto que, de acordo com Simmel, seus objetivos correspondem àqueles que os indivíduos apresentam como mais simples e primitivos, exatamente por serem os mais amplamente disseminados, ao passo que na experiência individual o ser humano é pressionado por comportamentos e impulsos contraditórios.
       A causa da formação da unidade social com base nos pensamentos mais simples está na ideia de que a semelhança e a diferença são os princípios essenciais do desenvolvimento externo e interno do ser humano: “é como se cada individualidade sentisse seu significado tão-somente em contraposição com os outros, a ponto de essa contraposição ser criada artificialmente onde antes não existia” (p.46). Conseqüentemente, o trágico da sociologia é o fato de que mesmo o indivíduo possuindo qualidades aprimoradas e cultivadas, a instância na qual será possível a comparação para formação da unidade será reduzida a camadas inferiores e sensorialmente primitivas: a massa torna-se “um novo fenômeno que surge não da individualidade plena de cada um de seus participantes mas daqueles fragmentos de cada um que coincidem com os demais. Esses fragmentos, contudo, não passam dos mais primitivos, aqueles que ocupam o lugar mais baixo do desenvolvimento” (p. 50). Assim, as ações da massa são sempre dominadas por uma ideia, de preferência a mais simples possível, faltando-lhe a consciência da responsabilidade, sendo experimentada por uma elevação extremada dos sentimentos.

     No terceiro capítulo, Simmel retoma os questionamentos acerca do objeto da sociologia, apresentando-nos o conceito de sociabilidade. Para ele, a sociedade parte da interação entre os indivíduos e comporta uma distinção entre forma e conteúdo. Nesta concepção, os indivíduos tendo diversas motivações (paixões, desejos etc), conteúdos da vida social, interagem a partir delas e se transformam em uma unidade. Esses conteúdos isolados não são sociais: a sociação apenas começa a existir quando os indivíduos interagem adotando formas de cooperação e colaboração, de modo que quanto mais interação existe no mesmo grupo, ele se torna mais sociedade. A sociação é a forma pela qual os indivíduos formam uma unidade para satisfazerem seus interesses, sendo forma e conteúdo, na experiência concreta, elementos inseparáveis.

     Paralelo a sociação, surge o conceito de sociabilidade: visto que a sociedade é a interação com outro para realizar os conteúdos materiais (individuais), e a partir da percepção de que as sociações envolvem, além dos conteúdos, a própria valorização da sociação pelos indivíduos. E as formas que resultam destes processos ganham vida própria, libertas dos conteúdos e existindo por si mesmas, constituindo a sociabilidade, que transforma a sociação em um valor apreciado em si. Em outras palavras, a sociabilidade é a “forma lúdica da sociação” (p. 65), não importando as motivações.
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     Por fim, no quarto capítulo, o autor discute acerca do indivíduo e da sociedade nas concepções de vida dos séculos XVIII e XIX, um exemplo da sociologia filosófica. Simmel desenha a evolução do conceito de individualidade partindo da proposição de incompatibilidade entre a igualdade e a liberdade, para chegar, enfim, no “conceito de individualidade do século XVIII, com sua ênfase na liberdade pessoal, que não exclui – ao contrário, inclui – a igualdade, porque a verdadeira pessoa é a mesma em qualquer ‘homem circunstancial’, [o que] encontrou sua perfeição abstrata em Kant” (p. 103). Por outro lado, na concepção século XIX, o autor aborda como o conceito de individualidade, inspirado pela tradição teórica do socialismo, se separa em dois ideais, a liberdade sem igualdade e a igualdade sem liberdade, desfazendo a síntese atingida no século XVIII.

     O ponto nevrálgico de toda esta discussão é apresentado logo no início do capítulo, resumido na relação que as forças e formas da sociedade mantêm com os indivíduos, e nos conflitos reais entre aqueles dois pólos, já que as exigências e atitudes sociais se contrapõem à situação individual. O conflito se estabelece por meio da inerência da sociedade no indivíduo e se mantém pela capacidade que o ser humano tem de se dividir em partes, colocando-se em uma relação conflituosa entre as partes do seu eu que se sentem como ser social e os impulsos não absorvidos por este caráter: “o conflito entre a sociedade e o indivíduo prossegue no próprio indivíduo como luta entra as partes de sua essência” (p. 84).
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     Concluindo, no livro Questões Fundamentais da Sociologia o leitor brasileiro finalmente encontrará a proposta teórica de Simmel de forma mais completa e organizada, tendo melhor visão da sua perspectiva micro-sociológica: é um clássico que chega no Brasil consolidando a nova tendência das ciências sociais de retomada do sociólogo alemão, finalmente fazendo jus à importância das suas obras.

Fonte e conteúdo na íntegra, sem edições minhas, disponível em (http://www.antropologia.com.br/res/res35.htm). Acesso em 09/06/2017.